Brasil usa tecnologia para produzir manga no semiárido

Cerca de 63% de toda a manga produzida no Brasil está localizada no Vale do São Francisco, uma região privilegiada em termos de sol e disponibilidade de água para irrigação. Questionados sobre como atingiram esse patamar, produtores locais, empresas e instituições do setor apontam que foi decisivo o investimento e o alto nível da tecnologia implantada nos pomares – desde a utilização de fertirrigação ao uso de reguladores de crescimento e bioestimulantes.

A manga está entre as dez frutas com maior produção em quantidade no Brasil. Atualmente, é a mais exportada deste país sul-americano, atingindo volume superior a 197 mil toneladas em 2019, e gerando receita em torno de 185 milhões de euros.

É cultivada em praticamente todos as regiões do Brasil, mas a de maior relevância – em termos de importância económica – é a região do Vale do São Francisco, que compreende os estados de Pernambuco e Bahia, as localidades de Livramento e Dom Basílio (Bahia), além do Norte de Minas Gerais e São Paulo.
As áreas produtoras destas regiões representam aproximadamente 75 mil hectares plantados, e esta região é responsável por 87% das exportações de manga brasileiras.

As principais variedades produzidas são Palmer, Tommy Atkins, Kent, Keitt e Haden. O volume de produção e a disponibilidade durante todos os meses do ano permitem que os produtores abasteçam o mercado doméstico e ainda exportem para todos os continentes, em qualquer período do ano.

Tecnologia impulsiona crescimento

Cerca de 63% de toda a manga produzida no Brasil está localizada no Vale do São Francisco, que fica numa região privilegiada em termos de sol e disponibilidade de água para irrigação. Questionados sobre como atingiram esse patamar, produtores locais, empresas e instituições do setor apontam que foi decisivo o investimento e o alto nível da tecnologia implantada nos pomares – desde a utilização de fertirrigação ao uso de reguladores de crescimento e bioestimulantes.

“A aquisição dessas tecnologias contribuiu certamente para o crescimento da produtividade, mantendo a qualidade exigida para exportação, o que também incentivou outros produtores a investirem na cultura, aumentando o tamanho das áreas plantadas”, aponta Conrado Dias, coordenador de Desenvolvimento de Mercado da Fertiláqua. Para este responsável, o Brasil conseguiu dobrar a sua produção de manga, atingindo 190 kg/planta, com uso de processo de revitalização do solo, controle de infestantes, sementes certificadas, desenvolvimento vegetativo e reprodutivo e colheita diferenciada.

A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) é um dos atores relevantes nesse contexto. “A necessidade do aumento da produtividade por área e a qualidade da fruta produzida levou ao desenvolvimento de tecnologias que permitem produzir em qualquer período do ano e de colocar o Brasil como um dos países que mais exporta fruta no mundo, atendendo todos os critérios de qualidade exigidos pelos países importadores”, afirma João Ricardo de Lima, investigador em Economia Aplicada da Embrapa Semiárido.

Neste ano de 2020, a quantidade de chuva nas áreas produtoras pode causar maiores dificuldades para o setor, pois aumenta a probabilidade de os frutos apresentarem problemas sanitários e eleva os custos com agroquímicos. Em termos de mercado interno, existe a expectativa da retoma do crescimento da economia brasileira e da redução do nível de desemprego, um fator importante para que as pessoas comprem mais fruta.

Em termos internacionais, os países produtores devem estar mais fortes em 2020, em comparação com 2019, o que gera dificuldades de concorrência para o Brasil. Por outro lado, o dólar valorizado é um atrativo para as exportações. Assim, o país acaba por se tornar mais competitivo em termos de taxa de câmbio. “A médio prazo, a quantidade de área com manga pode fazer aumentar muito o volume no mercado interno e levar à redução de preços, o que seria negativo em termos de rentabilidade para o produtor. Assim, temos a necessidade de abrir novos mercados noutros países, escoando os excessos gerados”, aponta Lima.

Marcelino Ribeiro/Embrapa

O poder da rega

A manga é uma fruta relativamente fácil de ser produzida e pouco exigente em mão de obra, o que torna possível externalizar várias etapas, da produção até à colheita. O nível de custos de produção define a qualidade e a produtividade a ser alcançada. Para Dias, a produção de manga é “quase artesanal”, sendo necessário conhecimento técnico sobre os estágios fenológicos da cultura, assim como dominar o uso de reguladores vegetais e bioestimulantes.

Para se obter frutos melhores e mais toneladas por hectare, defende Lima, é necessário investir mais: “Temos um leque grande de situações, desde pequenos produtores, pouco capitalizados, que investem pouco e possuem baixas produtividades, até grandes produtores, com produtividades elevadas e alta qualidade. Como a manga apresenta rentabilidades superiores a outras frutas e possui uma certa facilidade de produção e reconhecimento do mercado pela sua qualidade, as áreas com manga no Brasil têm crescido de forma mais rápida que a procura. O maior desafio será fazer crescer o consumo de manga, quer interno, quer nas exportações, para que o setor não enfrente uma crise”.

A principal tecnologia disponível, e que tem o poder de potencializar a manga no Brasil, é a rega. Há alguns anos, quando começou a ser utilizada, a irrigação utilizava maiores volumes de água. Atualmente, o uso de microaspersores e rega gota a gota faz com que se produza com um reduzido desperdício de água.

Outra questão diferente atualmente, elenca o investigador da Embrapa, é a produção de plantas mais baixas, com espaçamentos menores, produzindo uma grande quantidade de plantas por hectare. “O uso de reguladores de crescimento vegetativo para fazer a gestão da floração permitiu produzir o ano inteiro, sendo uma tecnologia fundamental. Finalmente, o uso de infravermelhos para se avaliar o estágio de maturação da planta está a permitir a colheita no ponto correto”, completa.

Já o coordenador da Fertiláqua ressalta que, por ser um país tropical, as plantas estão sujeitas a stresses abióticos, principalmente as temperaturas elevadas. “O uso de ferramentas, como condicionadores de solo, enraizantes e bioestimulantes foliares, com objetivo de amenizar esses stresses e manter a planta a trabalhar normalmente e a expressar o seu potencial produtivo, permite produzir com eficiência. É importante ressaltar que é um conjunto de ações. Assim, ter o sistema de irrigação dimensionado para atender à necessidade diária de água da cultura e uma adubação nutricional equilibrada é a base para alcançar elevados níveis nutricionais”, sustenta.

Mercado interno pequeno, dificuldades nas exportações

Apesar de ser um dos maiores produtores de grãos do mundo, o Brasil ainda não é um dos grandes players mundiais em frutas. De acordo com Lima, o país tem mais
dificuldade em concorrer com o estrangeiro devido aos elevados custos de produção, principalmente mão de obra e logística. “A fruta é bastante perecível e isso gera dificuldades na exportação para mercados mais distantes, por navio. O custo do envio aéreo é considerado muito alto. Para além disso, o Brasil possui um mercado interno muito grande, mas que consome pouca fruta. O nosso entendimento é que temos condições de atender o mercado sempre que os demais países concorrentes enfrentarem dificuldades e quebras nas suas colheitas. Em situações normais, em comparação com a concorrência, resta ao Brasil as janelas normais de mercado”, comenta.

Na visão do investigador de Economia Aplicada, não há clareza se os produtores de
manga brasileiros têm necessidade ou vontade de “entrar nesta briga” pelo mercado mundial. “Isto não significa que os produtores brasileiros não queiram exportar mais, pelo contrário, as exportações são importantes, pois é através delas que se escoa o excedente do mercado interno e permitem que os preços obtidos não caiam a ponto de inviabilizar o negócio. Contudo, para aumentar a competitividade, é necessário reduzir os custos de produção e os custos de logística e de frete para os países importadores”, aponta.

Um outro fator que estimularia mais os produtores, acrescenta Lima, seria conseguir realizar contratos de compra e venda com preço fechado, algo pouco usual no setor. Os preços foram, em 2019, mais baixos do que em anos anteriores. Contudo, dada a questão cambial, isso ainda favorece os produtores. “O governo brasileiro também poderia construir mais relações bilaterais com países visando o apoio ao setor”, complementa.

A Europa é o principal destino das exportações de manga do Brasil. As exportações ocorrem com maior intensidade a partir de agosto e podem ir até dezembro, desde que outros países, mas principalmente o Peru, tenham problemas com os seus embarques. Cerca de 78% das exportações brasileiras de manga têm como destino a Europa. Em 2019, foram enviadas 35,6 mil toneladas de manga para a União Europeia, o que gerou uma receita de exportações de 70 milhões de euros.

PRODUTOR DOBRA VOLUME

Manga Palmer, Santa Adélia Citrus

Menucci, a empresa Santa Adélia Citrus é referência em produção de manga no noroeste do estado de São Paulo. A empresa trabalha há três anos com as tecnologias da Aminoagro, marca que pertence ao Grupo Fertiláqua, um dos maiores em nutrição, fisiologia de plantas e revitalização de solo do Brasil.

Desde 2016 que a Santa Adélia Citrus antecipa entre dois a três meses a colheita de manga Palmer, oferecendo ao mercado esta fruta fora da época tradicional de maior oferta em São Paulo, que vai de dezembro a fevereiro, sendo possível obter um valor maior no quilograma da manga. Isto é possível graças ao Programa Construindo Plantas – PCP 360, que atua trabalhando em todos os estágios da cultura, desenvolvendo a lavoura com o máximo potencial produtivo, um manejo eficiente e com maior valor acrescido para a fruta.

Antes, produzíamos entre 80 a 84 kg por planta. Com o uso do PCP, obtivemos resultados excelentes, elevando a produção para 160 a 190 kg/planta”, explica Everton Lanza, proprietário da Santa Adélia Citrus. Outros pontos positivos destacados pelo produtor são a melhoria na qualidade e na padronização do fruto. “Antes, o florescimento não era uniforme e tínhamos frutos de diferentes formatos e em diferentes estágios, ocorrendo grandes perdas. Com o PCP, a colheita tem sido melhor e o pós-colheita também, pois o fruto está mais bem nutrido e consegue um maior tempo de prateleira”, esclarece Lanza.

Como a colheita antecipada é realizada no período seco, este fator também contribui para um menor índice de incidência de doenças. “O projeto de manga da Aminoagro mostra ao produtor que é possível – com suporte técnico, gestão adequada da nutrição, fisiologia da planta e investimento – aproveitar o máximo potencial produtivo da fruta com qualidade e rentabilidade”, explica Itamar Guerra, representante técnico de vendas da Aminoagro.

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Texto. Leonardo Gottems*


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