Biologia do solo e qualidade do sistema reprodutivo

Entender o sistema solo como um ambiente extremamente complexo, dinâmico e vivo, é algo que faz a diferença no manejo agrícola. O solo é basicamente composto por três pilares, sendo eles, químico, físico e biológico. Os dois primeiros são mais trabalhados e conhecidos pelo meio produtivo, muito devido ao desenvolvimento de estudos e pesquisas voltados a estes conhecimentos e objetivando entender e melhorá-los cada vez mais. O componente biológico do sistema solo, no entanto, ainda necessita ser inserido neste contexto de forma sistêmica, o que possibilitará entender e associar seu aspecto funcional inclusive com relação a química e física do solo. Pois neste momento, já se entende que não é viável ou sensato a análise de atributos do solo de forma isolada. 

Informações a cerca do potencial da biologia do solo e seus benefícios ainda precisam ser mais explorados e relacionados aos resultados observados a campo, exceto no tocante a funções específicas como fixação biológica de nitrogênio (FBN), por exemplo. A funcionalidade do sistema está ligada a biodiversidade dos grupos de organismos ou microrganismos que compõem a biologia do solo. Quando nos referimos aos microrganismos, este potencial funcional é ainda maior, visto que estudos revelam que realmente temos ‘um mundo debaixo dos nossos pés’, com mais de 10 mil espécies de microrganismos por grama de solo (Torsvik et al., 2009).

Neste sentido, surge o termo microbioma do solo, que nos remete ao entendimento deste aspecto funcional como algo dependente da ação conjunta dos integrantes deste sistema microbiológico do solo (Microbiologia do Solo, 2016).  A busca pelo entendimento acerca da complexidade e dinâmica destas funções no sistema de produção tem sido foco de muitos produtores agrícolas, e com certeza trata-se de uma mudança de paradigma na forma de produzir, com sustentabilidade e rentabilidade.

Um facilitador deste processo são as tecnologias que estão sendo inseridas no mercado com esta visão de reativar a biodiversidade deste microbioma do solo. Tecnologias que além de trazer a possibilidade de revitalização da biologia dos solos, ainda tem um importante papel como disseminadores dos conceitos e do potencial da fração biológica do solo aliado a qualidade e funcionalidade do sistema de produção. Funções relacionadas a disponibilização de nutrientes pela ação mineralizadora de fontes orgânicas advinda da atividade enzimática destes microrganismos (Lopes et al., 2013); pela melhoria no perfil do solo propiciando o melhor desenvolvimento do sistema radicular, atuando na agregação e porosidade dos solos (Salton et al., 2008), além da produção de substâncias importantes para o desenvolvimento vegetal, como as moléculas semelhantes a fitohormônios vegetais (Microbiologia do Solo, 2016). A proteção de plantas também é uma função extremamente importante no campo de produção, e basicamente ocorre em resposta ao equilíbrio biológico promovido pela biodiversidade do solo (Mendes et al., 2011). O solo biologicamente ativado e equilibrado é resiliente e menos dependente de ações antrópicas ao longo do cultivo da cultura.

A intensa atividade microbiológica e funções ligadas a proteção de plantas e fornecimento de nutrientes e substâncias importantes para o desenvolvimento vegetal ocorre na rizosfera. Neste local, ocorre também a seleção do microbiana devido a fontes de carbono ou exsudados microbianos liberados pela planta. As atividades da rizosfera são dependentes da complexidade e diversidade do microbioma do solo (Mendes et al., 2011; Mendes et al., 2017; Andreote & Pereira e Silva, 2017). Rizosfera é a área de influência das raízes, e o solo é considerado a fonte de primária de riqueza de espécies e diversidade para a rizosfera de plantas (Mendes et al., 2017).

A necessidade de implementação dos componentes biológicos para atuarem nos sistemas de produção, ocorre em resposta as formas atuais de manejo dos sistemas agrícolas. Por exemplo, devido a substituição ou talvez a ausência de inserção do sistema de plantio direto, que tem como um de seus princípios a rotação de culturas. Com o modelo de sucessão de culturas, muitas vezes inserido devido a demanda financeira, não ocorre a alteração durante ciclos produtivos das culturas implantadas na área, ou seja, são implantadas as mesmas culturas em cada período de cultivo (verão/inverno) e utilizadas as mesmas fontes de adubos, produtos fitossanitários, entre outros. Com essa homogeneização do sistema de produção, chamado de monocultivo, ocorre uma redução da biodiversidade dos organismos do solo e assim, do seu potencial funcional em todo sistema solo-planta (Andreote & Pereira e Silva, 2017). Quando nos referimos a ambientes que são cultivados com culturas perenes ou semi perenes, a situação é mais preocupante, devido a manutenção da mesma cultura por um período ainda maior.

Muitos produtores já entenderam a necessidade de alterar este sistema de produção, inserindo plantas de cobertura na entressafra ou mesmo juntamente as culturas (sistema santa fé, por exemplo), bem como a inserção de tecnologias ligadas a bioativação do microbioma do solo nas culturas de interesse econômico. Os resultados realmente são surpreendentes e revelam que em pouco tempo esta forma de produzir pode revolucionar a agricultura.  Parte desta conquista também se deve ao sucesso das tecnologias com microrganismos específicos ligados ao controle biológico, que são direcionadas a um determinado alvo no sistema de produção, por exemplo os nematoides e insetos. Outro ponto interessante são as formas de avaliação desta parte biológica do solo, que estão em constante melhoria, e neste sentido, percebe-se um empenho de diversos setores voltados aos estudos, pesquisas e análises para facilitar os conceitos e inserir as análises biológicas para avaliação dos manejos adotados (Microbiologia do Solo, 2016; Mendes et al., Circular Técnica, 2018).

Em síntese, o restabelecimento da biologia do solo representa um importante degrau neste novo momento da agricultura mundial. A mudança de ambientes anteriormente degradados biologicamente para ambientes com elevada biodiversidade e funcionalidade em todo sistema solo – planta é fundamental para obtermos a qualidade do solo, e por consequência, do sistema de produção, de forma que este seja produtivo e sustentável.

Assista ao vídeo no nosso canal do youtube e entenda mais sobre o assunto.

Manejo de solo para atenuar os estresses bióticos e abióticos

Escute também nosso Podcast discutindo sobre o tema.

<strong><span style="color:#007d36" class="has-inline-color">Dorotéia Alves Ferreira</span></strong>
Dorotéia Alves Ferreira

Engenheira agrônoma (UFG, Campus Jataí)
Mestre em Produção Vegetal, com dissertação em Microbiologia do Solo (UFG, Campus Jataí)
Doutora em Ciências, concentração em Solos e Nutrição de Plantas e tese em Microbiologia do Solo (ESALQ/USP, Piracicaba – SP
Parte da pesquisa da tese desenvolvida no grupo de Ecologia Microbiana na Universidade de Groningen (Groningen, Holanda)
Artigos publicados, participação em eventos nacionais e internacionais e palestras ministradas na área de Microbiologia do Solo.

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